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Saúde

Adoção intrafamiliar: um processo

"Convido a todos a esta pequena reflexão, destacando a necessidade de exercer adequadamente a adoção em todas as famílias..."

Clarissa Candiota
por  Clarissa Candiota
22/01/2020 08:52 – atualizado há 3 anos
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Um dia todos sentimos ser pais ou filhos adotivos e adotados. Acontece no momento do estranhamento e, logo, na aceitação do filho real, o processo de adoção ̶ reconhecer, identificar, aceitar, olhar, apreciar, amar e amar.

Escuto no consultório a expressão "eu sou mãe adotiva". Penso que eu também sou desde o dia em que acordei mãe de adolescente. Me dei conta naquele momento do dever de adotar aquela nova filha, tão diferente daqueles olhos de bebê que me esperavam e me completavam. Ali agora havia um outro olhar.

Eu, mãe, tive que aprender a entender os significados da adolescência. Em nossa história, eu já havia aprendido a decifrar os olhares das necessidades fisiológicas, sede, sono, fome, querer ou não querer o seio, a saudade de ser aquela mãe. Ali, naquele filho que eu precisava adotar, estava um olhar diferente que me fazia sentir diferente.

Meu desejo de ser mãe sempre foi maior que a vontade de gestar um filho. Surgiu a oportunidade de exercer a maternidade. Havia um olhar em um corpo que se constituía e me modificava.

Filho é livre, é independente, é autor da sua história, não é continuidade da nossa. Se formos referência será por escolha dele e não por capacidade nossa.

E aí, de repente iniciou-se o processo de adoção, nasceu uma mãe nova para aquele filho novo, e o desejo que ele também me adotasse. Conhecemos as potências e as impotências das emoções de amar e não amar, esperar o que não vai acontecer, aprender a ensinar, ensinar a aprender.

Sendo agora pais e filhos adotivos, nasce uma nova cena de respeito mútuo pelo fenômeno das escolhas, diferente dos destinos traçados na maternidade, onde as relações de posse e pertença são determinadas.

Convido a todos a esta pequena reflexão, destacando a necessidade de exercer adequadamente a adoção em todas as famílias, visto que os filhos do coração, assim chamados, crescem no terreno fértil do afeto.

Escrevo este texto como desabafo, de quem atua na área e passa também pela maternagem. Houve na minha família o despertar da nossa adoção mútua, ̶ foi difícil. Hoje, ainda me esforço para adotar também a tatuagem no corpo da minha filha, pois reside em mim o hábito da mãe velha com o sentimento de posse, de achar ainda que aquele corpo que saiu de dentro de mim de alguma forma me pertence. Cada um é dono de si e pode pintar o seu corpo como entender. Contudo, eu e ela nos escolhemos, todos os dias, como mãe e filha.

*Clarissa Candiota, psicopedagoga e especialista em aprendizagem humana

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