A CONTA
Acidentes de trânsito custam R$ 449 milhões ao SUS em 2024, aponta Ipea
Com esse montante, seria possível comprar cerca de 1.320 ambulâncias do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), o que representaria quase 50 unidades por Estado
O Sistema Único de Saúde (SUS) gastou R$ 449 milhões em 2024 com internações de vítimas de acidentes de trânsito no Brasil. O dado é resultado de um levantamento inédito realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), com base em informações do Datasus. O valor inclui desde atendimentos de emergência até reabilitação prolongada e fornecimento de órteses e próteses para os acidentados.
Com esse montante, seria possível comprar cerca de 1.320 ambulâncias do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), o que representaria quase 50 unidades por Estado. É quase quatro vezes mais do que prevê o Novo PAC Saúde, que contempla apenas 350 ambulâncias para atender 5,8 milhões de pessoas em todo o país. Segundo os cálculos, as 1.320 ambulâncias poderiam beneficiar aproximadamente 22 milhões de brasileiros com cobertura de urgência.

Os custos hospitalares com sinistros de trânsito vêm crescendo de forma constante. Em 1998, o SUS desembolsou R$ 301,7 milhões com internações relacionadas ao tema. Em 2024, o valor atingiu R$ 449,8 milhões, o que representa um aumento real de quase 50% em 27 anos. Para especialistas, o modelo de mobilidade individual adotado nas cidades brasileiras contribui para a elevação desses custos.
“O modelo atual é caro, ineficaz e perigoso. Criamos cidades para carros, mas não nos preparamos para os impactos disso”, afirma Victor Pavarino, oficial técnico em segurança viária da OPAS/OMS. Já Ricardo Pérez-Núñez, assessor regional da mesma organização, reforça a importância da prevenção: “Estamos gastando para reparar os danos da insegurança, em vez de investir para que esses danos não ocorram”.
O problema se agrava com o fim do repasse do DPVAT ao SUS. Até 2021, o seguro obrigatório para Danos Pessoais Causados por Veículos destinava 45% da arrecadação ao sistema público de saúde, o que representava cerca de R$ 580 milhões por ano. Esses recursos deixaram de ser repassados com a extinção do seguro, aprovada pelo Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) sob a justificativa de combater fraudes e reduzir custos de regulação.
Neste ano, o governo federal chegou a propor o SPVAT, novo seguro obrigatório para custear o atendimento às vítimas de trânsito. No entanto, após pressão de governadores e parlamentares contra a criação de um novo encargo para motoristas, a proposta foi revogada antes mesmo de entrar em vigor. A decisão foi criticada por especialistas e pesquisadores, que apontam prejuízos diretos aos serviços hospitalares.
“Isso prejudica os atendimentos hospitalares e deveria ser revisto”, afirma Carlos Henrique Ribeiro de Carvalho, pesquisador do Ipea. Já a OPAS estima que os sinistros de trânsito consomem de 1% a 3% do Produto Interno Bruto (PIB) dos países da América Latina. No caso brasileiro, isso pode significar entre R$ 117 bilhões e R$ 351 bilhões ao ano, considerando o PIB atual de R$ 11,7 trilhões.
Além da saúde, os impactos se estendem à previdência e à estrutura socioeconômica das famílias. “Quando um pai de família, que sustentava o lar, sofre um acidente grave, ele deixa de ser um provedor e passa a ser um custo — e um custo alto para o Estado”, conclui Pavarino. O cenário reforça o apelo de especialistas por mais investimentos em prevenção e políticas públicas de mobilidade urbana segura.