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Covid-19: Juristas questionam fiscalização de pais sobre vacinação de crianças
O ministro Lewandowski mandou o Ministério Público "empreender as medidas necessárias para a vacinação das crianças", com urgência.
Uma decisão desnecessária, questionável e que pode levar a um estado policialesco. Essa é a opinião de juristas renomados que consultados pelo jornal Gazeta do Povo sobre a determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, sobre a vacinação de crianças contra Covid-19, em resposta a um pedido do partido Rede Sustentabilidade. Na quarta-feira (19), o ministro mandou que os Ministérios Públicos dos estados e do Distrito Federal "empreendam as medidas necessárias" para a vacinação das crianças, com urgência.
Como o texto da decisão de Lewandowski é ambíguo e cita dispositivos sem responder diretamente ao pedido do partido Rede Sustentabilidade – que queria a perseguição de pais que não vacinassem os seus filhos pelos conselhos tutelares –, cabem diversas interpretações. Ontem mesmo, o presidente Jair Bolsonaro disse ter conversado com o ministro e garantido que a determinação não significava que o entendimento era o de que a vacinação de crianças contra a Covid-19 seria obrigatória.
Mas ao contrário do que diz a Rede e o MP-CE, a vacina contra a Covid-19 não está entre as vacinas obrigatórias, que poderiam ser alvo de ações persecutórias por parte dos Ministérios Públicos de acordo com o parágrafo primeiro do artigo 14 do Estatuto da Criança e do Adolescentes (ECA). Juristas apontam que o fundamental da questão é o fato de que a vacina contra Covid-19 não integra o Programa Nacional de Imunizações (PNI). Atualmente, o PNI prevê que as crianças brasileiras devem receber obrigatoriamente vacinas contra diversas doenças, como difteria, sarampo, coqueluche, paralisia infantil, caxumba, rubéola e tétano, mas não a de Covid-19. Além disso, ao anunciar o uso dessa substância para as crianças, o Ministério da Saúde afirmou que a vacinação não era obrigatória e só poderia ser aplicada com o consentimento dos pais.
Em 2020, o STF julgou uma ação em que pais veganos se recusaram a vacinar os filhos. Na época, a Corte decidiu, em repercussão geral – ou seja, para todos os casos similares – que os pais devem ser obrigados a vacinar, desde que o imunizante esteja registrado em órgão de vigilância sanitária, incluído no PNI ou tenha sua aplicação obrigatória determinada em lei ou seja objeto de determinação da União, Estado, Distrito Federal ou Município, com base em consenso médico-científico. O que não é o caso da vacina contra a Covid-19.
Para o jurista, um dos riscos da decisão de Levandowski é a da criação de um estado policialesco, em que o MP passe a enquadrar e coagir os pais que não vacinarem seus filhos. Mas isso vai depender da forma como cada MP vai trabalhar para seguir a determinação do STF. “Esse tipo de ação deve ser feita de uma forma equilibrada, com cuidado. Não podemos deixar que isso acabe se tornando um estado onde a população passa a se vigiar e denunciar um ao outro. Quando esse tipo de ação começa, significa que a civilização está indo muito mal”, diz o jurista.