Rio Grande do Sul
Sindicância conclui que não houve racismo em prisão de motoboy em Porto Alegre
Os dois envolvidos na briga foram indiciados pela Polícia Civil
A sindicância que apurava o suposto caso de racismo na abordagem da Brigada Militar (BM) do Rio Grande do Sul ao homem negro, vítima de um golpe de canivete de um idoso no último final de semana em Porto Alegre, concluiu que os brigadianos não agiram de forma racista. Os dois envolvidos na briga foram indiciados pela Polícia Civil (PC).
Representantes da Secretaria da Segurança Pública (SSP), BM e PC apresentaram os resultados da sindicância da Corregedoria da BM e de uma investigação da 3ª Delegacia de Polícia Civil sobre a abordagem da Brigada realizada em 17 de fevereiro no bairro Rio Branco, em Porto Alegre, e seus desdobramentos.
Na ocasião da abordagem, no último sábado (17), os policiais militares foram chamados ao local em razão de uma ocorrência envolvendo dois homens: o motoboy Everton Henrique Goandete da Silva e o morador de um prédio próximo, Sérgio Camargo Kupstaitis. Ambos acabaram conduzidos algemados a uma delegacia.
Imagens de câmeras de segurança mostram o motoboy jogando pedras em Sérgio Camargo Kupstaitis depois do homem branco acertar o entregador com um canivete. Segundo a apuração, os desentendimentos de Sérgio com motoboys da região já vinham acontecendo há dias antes da ocorrência. Os dois serão indiciados por lesão corporal leve.
Everton também responderá por desacato à autoridade por ter ignorado as ordens dos oficiais na abordagem.
A sindicância da BM não verificou indícios de crime militar ou de crime comum de parte dos policiais militares.
“Não houve agressão física perpetrada pelos policiais militares. Todas as 21 testemunhas que foram trazidas voluntariamente ou se apresentaram ratificaram que não houve nenhum tipo de agressão física por parte dos policiais em relação aos presos e que não houve qualquer agressão verbal, nem qualquer tipo de discriminação”, disse o o corregedor-geral da BM, coronel Vladimir da Rosa.
Houve, no entendimento da Corregedoria, “transgressão da disciplina militar” por dois motivos: em razão de os policiais não terem acompanhado um dos homens (Sérgio) durante seu deslocamento para vestir camiseta e buscar seu documento; e por não terem observado que havia chegado uma segunda viatura no local devidamente equipada para a condução dos presos na parte traseira. Em razão disso, Sérgio foi conduzido no banco de trás de uma viatura.
A Corregedoria tem oito dias para notificar os quatro policiais do resultado da sindicância. Uma vez notificados, eles têm o prazo de 15 dias para apresentar suas defesas.
Depois disso, conforme o entendimento da Corregedoria, eles poderão cumprir um período de detenção. Referente às abordagens, por não haver indícios de crime, o caso não será remetido à Justiça comum ou à Justiça Militar.
Se for do entendimento dos seus comandos, os PMs podem voltar imediatamente a ações de campo. Dois deles haviam sido deslocados para trabalhos administrativos até o final da sindicância.
Em relação à investigação da PC, os dois homens, Everton e Sérgio, foram indiciados por lesões corporais leves e, Everton, por desobediência. O caso foi remetido ao Poder Judiciário, que decidirá sobre oferecer ou não denúncia contra os indiciados.
“Caso o Ministério Público ou o próprio Poder Judiciário entenda que houve um crime mais grave, o inquérito policial retorna à delegacia para novas diligências. Porém entendemos que o fato está devidamente elucidado por parte da Polícia Civil”, disse o delegado da PC Heraldo Chaves Guerreiro.
Entenda o caso
O incidente foi gravado por testemunhas e gerou questionamentos sobre possível motivação racista no tratamento dado pelos policiais a cada protagonista. Nas imagens é possível ver o motoboy negro, de 40 anos, dando explicações a um dos brigadianos que atendem a ocorrência, enquanto uma policial da equipe conversa com o suposto agressor, de 71 anos e morador de um prédio a poucos metros dali.
Em determinado momento, o motoboy relata ter sido golpeado com arma branca na região do pescoço e diz que trabalha na região, mas é interrompido pelo agressor: “Não trabalha, nada!”. A vítima se irrita e acaba agarrado pela camisa por um policial, que então o pressiona contra a parede de um prédio, sob acusação de desacato. Populares tentam, em vão, alertar aos policiais de que o trabalhador é o agredido, e não o contrário.
Apesar da presença de outros três agentes, o suposto agressor sai andando do local sem ser importunado, enquanto os policiais imobilizam o homem ferido e o algemam, sob protestos de pessoas que acompanham o incidente. O agressor só é detido e também algemado por pressão de populares – antes, ele foi autorizado a pegar uma roupa em casa, acompanhado de brigadianos que não recolheram o canivete utilizado contra o motoboy.
Outro aspecto que gerou indignação foi o transporte do motoboy em um camburão da BM, enquanto o outro homem conversava tranquilamente com os brigadianos, antes de ser conduzido no banco de trás de uma viatura. Após o registro da ocorrência no posto da Palácio da Polícia, ambos acabaram liberados.