Segurança

Sobrevivente que se especializou em Engenharia de Incêndio é ouvido no julgamento do caso Kiss

Emanuel Pastl estava na festa com o irmão gêmeo, a cunhada e amigos.

Por Rádio Guaiba Publicado em 02/12/2021 13:21 - Atualizado em 03/06/2024 10:59

O segundo dia do julgamento do Caso Kiss começou com o depoimento de Emanuel Pastl, sobrevivente que se especializou em Engenharia de Incêndio após a tragédia. Pastl, de 27 anos, comemorava o aniversário com o irmão gêmeo, a cunhada e amigos na ocasião e possivelmente foi uma das primeiras pessoas conseguir deixar o local, antes mesmo da chegada do Corpo de Bombeiros. A testemunha relatou não ter visto luzes de emergência, extintores e alarme de incêndio na boate. Uma das jovens que estava com o grupo, Allana Willers, de 18 anos, morreu no incêndio.

Após um atraso, o segundo dia de júri começou por volta das 9h30min, com cerca de uma hora e meia de questionamentos por parte do juiz Orlando Faccini Neto, da acusação e dos advogados de defesa. Pastl relatou que morava em Porto Alegre e que aquela havia sido a primeira festa que tinha comparecido em Santa Maria, a convite do irmão, que estudava na Universidade Federal do município. Segundo a testemunha, eles estavam próximos do bar e da saída de emergência quando o incêndio começou. Inicialmente, acreditou ser um princípio de tumulto, mas logo percebeu a presença de fumaça cinza subindo. Antes das luzes e do som se desligarem, o grupo começou a se dirigir à porta.

“Me desencontrei do meu irmão, ele seguiu no sentido esquerdo, com as gurias, e eu segui no sentido direito. De repente, teve aumento significativo da presença de fumaça na camada respirável e de temperatura também, numa situação insuportável. Nesse momento, as pessoas entraram em estado de pânico, começaram a se atropelar, se puxar, se empurrar”, contou. Ele estima que a situação toda não tenha durado mais do que um minuto e meio. Logo em seguida, as luzes e o som se desligaram. Pastl se desencontrou de Allana, que havia seguido pela direita com ele, e sacou o celular para iluminar parte do ambiente, mas logo acabou derrubado no chão. Ele disse que ainda sentiu alguma substância pingando em sua pele antes de conseguir sair do local.

Reprodução TJRS

O sobrevivente calcula sua saída tenha durado de três a quatro minutos – os bombeiros chegaram à boate em aproximadamente sete minutos. Ele contou que, do lado de fora, tentou procurar ajuda, mas não foi atendido, e retornou à Kiss quando escutou as sirenes. Nas imediações do prédio, viu um rapaz com muitos ferimentos, ajudou-o a entrar numa viatura da polícia e pediu para que fossem levados ao hospital. Com queimaduras nos olhos, Pastl foi levado para a emergência do Hospital de Caridade, onde já havia outras vítimas. Ele ainda foi transferido para Canoas, onde foi direto para a UTI e foi intubado por quatro dias. Seu irmão, que desmaiou durante o incêndio, também foi internado no local e teve uma internação de mais dias por conta de uma infecção.

A testemunha contou que, assim como o irmão, teve algumas sequelas, como cicatrizes de queimadora e o desenvolvimento de uma bronquiolite por conta da inalação da fumaça. Ainda conviveu com episódios de síndrome do pânico por cerca de duas semanas após a tragédia, mas disse que hoje está bem e consegue falar normalmente sobre o ocorrido.

Pastl formou-se em Engenharia de Minas e, um pouco antes de concluir a graduação, começou a trabalhar em uma empresa de proteção contra incêndio. Especializou-se em Engenharia de Segurança do Trabalho e, posteriormente, em Engenharia de Incêndio. Não atua com PPCI ou instalações gerais, mas na parte de proteção passiva, compartimentações e selagem. Questionado pela promotora Lúcia Helena Callegari se sua escolhe profissional teve relação com o ocorrido, respondeu: “Não sei dizer se foi em decorrência dos fatos, foi uma oportunidade que surgiu para mim e tenho tentado cumprir com meu dever”.

A promotora chegou a perguntar como a testemunha conheceu sua esposa. Pastl chegou a questionar se a pergunta era pertinente, mas acabou respondendo que a companheira foi a enfermeira que cuidou de seus ferimentos durante a internação. A maior parte das demais perguntas, tanto da acusação quanto das defesas, girou em torno das características da boate com relação à prevenção contra incêndio e sobre sua visão enquanto profissional da área. O sobrevivente reiterou que não tinha conhecimento das normas da época na cidade e que não conhece o enquadramento legal da edificação, mas disse que a Kiss estava cheia na ocasião e que, durante sua saída do local, não viu extintores e alarme de incêndio, iluminação de emergência e sinalização. Também relatou que havia apenas uma saída de emergência.

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