VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

Violência doméstica cresce no Brasil apesar dos 19 anos da Lei Maria da Penha

Especialistas alertam que, apesar de sua importância, a efetividade da lei depende de políticas públicas integradas e de uma rede de proteção bem estruturada para garantir a segurança das mulheres.

Por Redação Publicado em 07/08/2025 14:28 - Atualizado em 07/08/2025 14:41

Os dados mais recentes do Anuário de Segurança Pública, divulgados no mês passado, revelam um cenário alarmante: os casos de violência doméstica contra mulheres continuam aumentando de forma preocupante no Brasil.

Esse aumento contrasta com o fato de o país contar com uma das legislações mais reconhecidas no combate à violência contra a mulher — a Lei Maria da Penha, que completa 19 anos nesta quinta-feira (7).

Apesar de ser considerada referência, o grande desafio permanece em sua efetiva aplicação. Especialistas ouvidas pela Agência Brasil ressaltam que, para sair do papel, a lei depende da implementação de políticas públicas estruturadas, com ações integradas de prevenção e um sistema de proteção e acolhimento específico para as mulheres em situação de violência.

O último Anuário de Segurança revela um cenário alarmante: o Brasil registra, em média, quatro feminicídios e mais de dez tentativas de assassinato por dia, sendo que 80% dos agressores são companheiros ou ex-companheiros. Nos últimos dois anos, ao menos 121 mulheres foram mortas mesmo estando sob medida protetiva. Em 2024, das 555 mil medidas concedidas, mais de 101 mil foram descumpridas — evidenciando a fragilidade do sistema de proteção.

A pesquisadora Isabella Matosinhos, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, destaca que, embora a Lei Maria da Penha permita medidas protetivas urgentes com aplicação rápida, sua eficácia é limitada quando não evita novas violências. Ela defende que as políticas públicas devem focar nos casos em que essas medidas falham. Isabella também alerta para possível subnotificação de descumprimentos e mortes sob medida protetiva, e critica a falta de integração entre os serviços de saúde, assistência social e segurança, prevista pela lei. Segundo ela, uma fiscalização mais rigorosa dos agressores pelas polícias é essencial para garantir a proteção das mulheres.

A professora Amanda Lagreca, da UFMG, defende que as políticas públicas voltadas à proteção das mulheres devem considerar a complexidade da realidade brasileira, exigindo implementação efetiva por parte das instituições. Ela e a pesquisadora Isabella Matosinhos destacam que, embora o atendimento funcione melhor nas capitais, no interior há falta de estrutura e investimentos para sustentar a rede de apoio. Ambas ressaltam que a violência atinge mulheres de todas as classes, mas com maior impacto sobre mulheres negras (63,6% das vítimas) e jovens entre 18 e 44 anos (70,5%), geralmente mortas dentro de casa por parceiros ou ex-parceiros.

As pesquisadoras destacam que a Lei Maria da Penha oferece uma abordagem ampla de prevenção, com medidas que vão desde o afastamento do agressor até sua participação em grupos reflexivos. Apesar disso, alertam para a tendência legislativa de focar apenas no aumento de penas, em vez de fortalecer políticas públicas. A professora Amanda Lagreca lembra que a lei é fruto da luta da sociedade civil e reconhecida como um marco na defesa dos direitos humanos das mulheres. Ela ressalta a importância de levar esse debate a espaços educativos para combater a cultura da violência. Um dos avanços recentes foi a inclusão da violência psicológica como forma de agressão.

As pesquisadoras ressaltam que a solicitação de medida protetiva exige um histórico prévio de violência, o que limita sua aplicação preventiva. Para evitar as primeiras agressões, é necessária uma mudança cultural profunda. Elas avaliam que a Lei Maria da Penha surgiu em um momento crucial da luta pelos direitos das mulheres no Brasil. Para a professora Amanda Lagreca, o agravamento da violência de gênero representa um dos maiores desafios da democracia, e a lei seguirá sendo uma ferramenta essencial no enfrentamento desse problema.

* Com informações da Agência Brasil

Rio Grande do Sul já registra mais de 10 mil casos de violência contra mulheres neste ano

Desde o início deste ano, o Rio Grande do Sul já registrou mais de 10 mil casos de violência contra as mulheres, mas apenas 1,94 mil denúncias foram formalizadas.

Em 2024, foram mais de 31 mil registros, com somente 5,65 mil denúncias oficiais, o que escancara o abismo entre ocorrência e denúncia, revelando um problema estrutural e psicológico que segue presente no cotidiano de muitas brasileiras. Os dados englobam qualquer ato que atente ou viole os direitos humanos das vítimas.