Economia
Entenda o que pode mudar na cobrança do ICMS estadual sobre combustíveis
Depois da aprovação na Câmara dos Deputados, projeto segue para o Senado.
A Câmara dos Deputados aprovou um projeto que muda o cálculo da tributação dos combustíveis para tentar baixar o preço cobrado ao consumidor final. Para ter validade, o texto ainda precisa passar pelo Senado.
A proposta em discussão abrange somente a cobrança do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Produtos (ICMS), um imposto estadual. O governo federal avalia que essa tributação onera o consumidor final com “alíquotas excessivas”.
De acordo com levantamento do Instituto Superior de Administração e Economia da Fundação Getúlio Vargas (ISAE/FGV), os combustíveis, a energia elétrica e a carne estão entre os itens que mais têm pesado no bolso do brasileiro e na inflação oficial do país.
Atualmente, o ICMS é cobrado em porcentagem sobre o preço final do produto, e as alíquotas variam de acordo com cada estado. No caso da gasolina, por exemplo, o tributo varia de 25% a 34% do preço. Para o diesel, a cobrança vai de 12% a 25%.
No sistema atual, em um formato de “substituição tributária”, o ICMS é recolhido na etapa inicial da cadeia de produção, ou seja, nas refinarias, mas o valor engloba toda cadeia do setor – abrangendo as distribuidoras e os postos de combustíveis.
Como o tributo é recolhido antecipadamente nas refinarias, é preciso estimar o preço final ao consumidor em cada estado para aplicar a alíquota de ICMS. Nesse processo, cada ente da federação define o chamado “preço médio ponderado ao consumidor final”, feito a cada 15 dias.
Deste modo, os tributos também fazem parte da base de cálculo para o preço futuro dos combustíveis – sobre o qual incidirá a tributação.
Além disso, em um cenário de alta do petróleo e do dólar (fatores que pesam para o preço de produção, definido pela Petrobras e importadoras), os estados arrecadam mais recursos mesmo sem aumentar a alíquota do ICMS.
“A realidade é que a maioria dos estados sequer alterou, nos últimos anos, a alíquota de ICMS incidente sobre os combustíveis. Ocorre que o aumento do preço de comercialização pela Petrobras tem expandido a base de cálculo sobre a qual incide a alíquota de ICMS e, com isso, ocasionado também o aumento da arrecadação dos estados com o ICMS-Combustíveis”, informou a Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite).
Novo modelo proposto
O projeto em discussão pelo Congresso Nacional estabelece que o ICMS deixará de ser cobrado como uma porcentagem sobre o preço final do produto. A proposta é o tributo passe a ser um preço fixo, em reais, por litro de combustível.
Assim, se o preço ao consumidor subir por conta de custos de produção (alta do dólar e do petróleo), a tributação não ficará maior, como ocorre atualmente, pois a alíquota cobrada continuará sendo fixa em reais (R$ por litro).
Pela proposta, os estados teriam autonomia para definir, uma vez por ano, as próprias alíquotas de ICMS (em R$ por litro), desde que não ultrapassem o valor da média dos preços “usualmente praticados no mercado” nos últimos dois anos. E o valor desse tributo deve vigorar pelos 12 meses subsequentes.
Se o texto virar lei, o primeiro reajuste feito pelos estados deverá considerar o preço médio praticado entre janeiro de 2019 e dezembro de 2020.
Ao considerar um período mais amplo (últimos dois anos) para estabelecer um teto para a alíquota, a proposta tende a reduzir a tributação cobrada do consumidor final – pois o petróleo tem subido mais intensamente nos últimos meses. Além disso, a nova alíquota não poderia ser alterada por um ano.
Segundo o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) – apoiador do texto –, a mudança no formato de tributação do ICMS permitirá a redução do preço da gasolina em 8%; do etanol em 7%; e do diesel em 3,7%.
Perda de receita
Representantes dos governos estaduais apontam, porém, que a nova regra provocará danos à arrecadação local.
Em nota divulgada nesta quarta-feira (13), o Comitê Nacional de Secretários de Fazenda Estaduais (Comsefaz) afirma que, se aprovado, o projeto deve reduzir em R$ 24 bilhões as finanças dos estados – o que, consequentemente, significa perda de R$ 6 bilhões aos municípios.
Segundo os estados, o ICMS sobre combustíveis arrecadou cerca de R$ 90 bilhões em 2019, representando cerca de 18% do total de R$ 509 bilhões de arrecadação do tributo naquele ano. Os estados lembram que 25% do ICMS é repassado aos municípios. Em alguns estados, como no Piauí, diz a Febrafite, o ICMS sobre combustíveis representa mais de 30% da arrecadação do tributo.
Opinião de especialistas
Em audiência pública sobre a mudança no formato de cobrança do ICMS sobre combustíveis, na Comissão de Finanças e Tributação (CFT) da Câmara, em maio deste ano, especialistas do setor avaliaram que a proposta, se implementada, simplificaria a tributação e evitaria o acúmulo de créditos pelas empresas do setor, além de diminuir as ações na justiça, mas não evitaria a alta no preço dos combustíveis.
Na ocasião, Carla Borges Ferreira, pesquisadora do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), observou que a maior parte do preço dos combustíveis, no Brasil, refere-se ao valor cobrado pela Petrobras, que varia de acordo com o preço internacional do petróleo e com a variação do dólar.
Eduardo Maneira, professor da Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (FND/UFRJ), avaliou, em maio deste ano, o ICMS não é fator fundamental para definir, no cenário atual, o preço dos combustíveis.
“Não vai ser ‘ad rem’ [uma alíquota fixa como quer o governo federal] ou ‘ad valorem’ [percentual sobre o preço final] que vai estabelecer a estabilidade dos preços dos combustíveis. São vários fatores, variação cambial, fatores de produção, incidência de outros tributos”, disse, naquele momento.
Valéria Lima, diretora-executiva do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) disse não acreditar que o ICMS seja causador do aumento de preços dos combustíveis no país, mas também avaliou que a proposta do governo estabelecer uma alíquota em reais geraria maior simplificação tributária.