Saúde
Fiocruz vê cenário promissor, mas alerta que pandemia não acabou
Análise foi publicada no boletim do Observatório Covid-19
Diante da queda nos indicadores de monitoramento da pandemia a nível nacional, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) classificou nesta quinta-feira (24) o cenário atual como bastante promissor, mas destacou que as desigualdades do país criaram diferentes realidades até mesmo dentro de um mesmo município. A análise foi publicada no boletim do Observatório Covid-19, que frisa ser equivocado pensar em redução de leitos, testagem e uso de máscara no país como um todo.
A Fiocruz afirma que a pandemia acentuou desigualdades estruturais no país, e que a partir dela é possível observar, no mínimo, a existência de dois Brasis, um do Norte e outro do Sul. O boletim compara São Paulo e Rio Grande do Sul a Maranhão e Pará, e afirma que os estados do Sul e Sudeste estiveram sempre acima da média nacional de vacinação e já mostram ter passado do pico de infecções da variante Ômicron. Os estados do Norte e Nordeste, por outro lado, ainda podem estar atravessando o pico de casos e têm curvas de óbitos ainda em movimento de alta.
Carnaval
A recomendação dos pesquisadores é a manutenção de medidas de distanciamento físico, uso de máscaras e higienização das mãos mesmo em ambientes abertos onde possa ocorrer maior concentração e aglomeração de pessoas. Nesse contexto, o boletim cita o Carnaval. "Que festas ou bailes em casas, clubes ou outros ambientes só sejam realizadas com comprovante de vacinação".
Para a Fiocruz, o enfrentamento do cenário atual da pandemia exige combinar políticas de combate às fake news com busca ativa dos não vacinados pela Atenção Primária à Saúde. Também são sugeridas estratégias de ampliação de horário das unidades de saúde e campanhas de vacinação nas escolas, atingindo crianças, pais e professores. Outro ponto que deve ser avaliado são políticas públicas que considerem a exigência de passaporte vacinal nos locais de trabalho, para trabalhadores de empresas privadas e públicas, além de motoristas de transporte de pessoas, como ônibus, táxis e aplicativos.
A média diária de novos casos de covid-19 no período de 6 a 19 de fevereiro foi de 120 mil casos, o que representa queda de 0,3% em relação às duas semanas anteriores. Os óbitos se mantiveram em um patamar considerado alto, com 860 mortes por dia em média, uma quantidade 0,2% maior que entre 23 de janeiro e 5 de fevereiro.
"Apesar das dificuldades de acesso a dados de teste (muitos estados não apresentam dados recentes), percebe-se uma ligeira redução no índice de positividade dos testes, isto é, a proporção dos testes de diagnóstico por RT-PCR realizados que apresentam resultados positivos. Portanto, se espera para as próximas semanas uma redução também dos indicadores que mais preocupam a população e os serviços de saúde: a mortalidade e a internação em UTI [unidade de terapia intensiva] por covid-19".
Letalidade em queda
A Fiocruz destaca que, com o avanço da vacinação, a taxa de letalidade por covid-19 no Brasil alcançou valores baixos e compatíveis com os padrões internacionais, de cerca de 0,8%, após vários meses oscilando entre 2% e 3%. Esse percentual poderia cair ainda mais com a ampliação da vacinação em regiões de baixa cobertura vacinal e com a aplicação de doses de reforço em grupos populacionais mais vulneráveis. A letalidade mede o percentual de pessoas diagnosticadas com a doença que foram a óbito, o que é diferente de mortalidade, que é a relação entre o número de mortos e o total de habitantes de uma região.
"Ao mesmo tempo em que começam a cair os indicadores de transmissão nas capitais e regiões metropolitanas, a difusão do vírus em direção a regiões com baixa cobertura de vacinação e precária infraestrutura de serviços de saúde pode gerar quadros epidemiológicos perigosos, com um aumento de casos graves e mesmo óbitos nas próximas semanas".
Na avaliação apresentada no boletim, a letalidade será um dos fatores que vão definir a mudança da covid-19 de pandemia para endemia, quando a doença será considerada parte do cotidiano. Eles argumentam que quando a ocorrência de formas graves que requerem internação seja suficientemente pequena para gerar poucos óbitos e não criar pressão sobre o sistema de saúde, será possível dizer que se trata de uma doença para a qual é possível assumir ações de médio e longo prazos sem precisar contar com estratégias de resposta rápida.
Apesar da queda na letalidade, ela ainda é maior na população idosa. A onda de casos causada pela variante Ômicron fez com que as internações e óbitos voltassem a se concentrar na população de idade mais avançada, o que a Fiocruz relaciona à proteção conferida à toda a população adulta pelas vacinas. Por outro lado, a baixa cobertura vacinal das crianças segue como uma preocupação.
"Trata-se de um grupo com intensa interação social com outros grupos, contribuindo de forma importante para a dinâmica da transmissão da doença. Além disso, elas se tornaram particularmente vulneráveis por estarem cercadas de pessoas já com esquema vacinal completo, ou em curso, tornando-se alvo do vírus, que não encontra nelas barreiras para a sua multiplicação", explica o boletim, que acrescenta casos graves de covid-19 em crianças podem levar a um colapso na saúde com maior facilidade, "uma vez que há uma histórica baixa disponibilidade de leitos de UTI neonatal e principalmente de CTI pediátrico no país".