Saúde
Lockdown de 14 dias na capital gaúcha pode salvar mais de 930 vidas, sugere estudo
Ainda que não sendo o ideal, período curto de restrições severas daria um "folego" maior ao sistema de Saúde da Capital.
O momento crítico do sistema de saúde e do avanço da Covid-19 em Porto Alegre aponta para a necessidade de medidas mais severas de restrições, e até extremas, conclui um estudo elaborado pelo doutor em Matemática e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Álvaro Krüger Ramos. De acordo com as projeções, um lockdown de 14 dias na Capital teria o potencial de evitar quase 47 mil novas contaminações e 938 mortes relacionados à doença em até quatro meses. Atualmente, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) contabiliza 2.909 óbitos e 121.747 infectados.
Pela situação complexa dos hospitais e a fila de espera de mais de 300 pessoas por um leito de Unidade de Terapia Intensiva (UTI), o matemático reconhece que a paralisação de duas semanas não é ideal para alterar a curva de contágio e mortes, mas que, diante também do delicado momento econômico, é uma medida necessária, e possível, para dar “um pequeno fôlego ao sistema de saúde municipal, tanto público quanto privado” e salvar vidas.
“O ideal seria um lockdown de 21 dias, deste modo, é possível zerar a fila de pacientes esperando por leitos de UTI. No entanto, a paralisação de duas semanas servirá para achatarmos o crescimento da curva de infecções e dar os resultados a longo prazo. Em curto prazo, 14 dias, acredito que conseguíramos ver uma queda no número de internações nas UTIs”, explicou. “Nas últimas semanas, observamos um retorno do crescimento muito semelhante ao exponencial, que ocorria no começo da pandemia. Por isso, essa volta da necessidade em achatar a curva, algo que conseguimos um ano atrás, quando o momento não era tão dramático”, acrescentou.
Na avaliação de Krüger Ramos, as restrições severas bem feitas passam não só pela determinação do poder público, mas também por fiscalização e orientações claras quanto ao que deve ser feito pela população: “Todos em casa, fiscalização severa, com uma mensagem direta dos governantes da necessidade de cumprir as regras”.
Em seu estudo, uma das variantes consideradas é o nível de isolamento social da população, que ficou na média de 40% neste mês, apesar das restrições da bandeira preta do Modelo de Distanciamento Controlado. No cenário projetado pelo matemático, em que a situação segue como está e nenhuma ação é feita, Porto Alegre pode triplicar o número de novas infecções até 31 julho de 2021 – aí seriam 226.265 novos contaminados até lá, o que potencialmente poderia significar 4.525 fatalidades.
“Temos que controlar a transmissão”
“As regras atuais impediram a situação de piorar, mas o problema é que elas são medidas intermediárias. O governo do Estado não deu o passo inteiro. É preciso, além dessas medidas, impor o isolamento social. Está na hora de um passo a mais. A medida é extrema. Não é mágico, mas a longo prazo diminuiu consideravelmente o número de novos casos e óbitos. Temos de controlar na base, temos de controlar a transmissão viral. Aumentar leitos de UTI, significa só adiar o problema. Ter UTI para todo mundo, é importantíssimo, é fundamental, mas não adianta aumentarmos os leitos, pois eles seguirão lotando e as pessoas morrendo”, afirmou.
Na contramão do sugerido, o governo do RS planeja um retorno da cogestão e uma retomada das atividades comerciais nas cidades a partir da próxima segunda-feira.
O pesquisador também reconhece que, no seu estudo, a letalidade da Covid-19 está projetada em 2%, porém este número pode crescer devido a lotação nos hospitais e o esgotamento dos profissionais de saúde: “As equipes de saúde estão exaustas e sobrecarregadas e isso influencia diretamente”.
Cenários considerados pelo estudo e o panorama no final de julho:
– Cenário sem lockdown – 343.977 casos
– Cenário 1 – lockdown de 14 dias – 297.093 casos
– Cenário 2 – lockdown de 21 dias – 274.849 casos
Em todas as suas análises, Krüger Ramos reitera que as ações são para evitar a piora nos números “assustadores” observados em Porto Alegre e defende a vacinação em massa. “Para cair os indicadores, a vacinação é a melhor arma. A nova cepa, a P.1, está se tornando predominante e ela é muito mais contagiosa. É como se tivéssemos recomeçado a pandemia. A imunidade natural está sendo perdida e por isso as vacinas são fundamentais”, enfatizou.
A campanha de imunização, inclusive, já está sendo considerada nos dados do estudo, e se continuar em seu ritmo atual, ela não é capaz de alterar as projeções realizadas.
Estudo anterior previu total de infecções no final de 2020 na Capital
Este não foi o primeiro modelo matemático utilizado pelo pesquisador da Ufrgs, Álvaro Krüger Ramos, para analisar o impacto da Covid-19. Em julho de 2020, quando Porto Alegre tinha menos de 5 mil casos e os hospitais começaram a sentir forte pressão nos leitos de UTI, o professor aplicou as mesmas variáveis matemáticas utilizadas no seu novo estudo para analisar cenários futuros.
Na ocasião, o pesquisador projetou que, sem lockdown, o que acabou ocorrendo, a Capital finalizaria o ano com 84.713 contaminados. O boletim publicado pela SMS no dia 31 de dezembro informou 80.085 infectados. “Sem controle artificial, as decisões dos governos do poder público e a adesão social, a pandemia segue o modelo matemático”, finalizou.