Cidade

Remuneração de presos em 75% do salário mínimo é constitucional

Lei de Execução Penal não fere a Constituição ao fixar como remuneração a presos o valor base de 3/4 do salário mínimo.

Por AE - Agência Estado Publicado em 04/03/2021 17:58 - Atualizado em 31/07/2024 09:20

De acordo com Fux, no entanto, o trabalho do preso tem caráter educativo e produtivo. Ainda para ele, a reinserção no mercado de trabalho justifica o pagamento diminuto previsto na LEP.

O trabalho do preso tem natureza e regime jurídico distintos da relação de emprego regida pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Além disso, pagar menos ao detento garante a sua inserção no mercado. Com isso em vista, a Lei de Execução Penal não fere a Constituição ao fixar como remuneração a presos o valor base de 3/4 do salário mínimo.

O entendimento é do Plenário do Supremo Tribunal Federal. O caso foi julgado em sessão virtual encerrada no último dia 26. Venceu o voto do ministro Luiz Fux, relator do processo. Ele foi seguido por Alexandre de Moraes, Marco Aurélio, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Nunes Marques e Luís Roberto Barroso. Abriram divergência Edson Fachin e Gilmar Mendes. As ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber seguiram Fachin.

A arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF 336) foi ajuizado pela Procuradoria-Geral da República em 2015, quando era chefiada por Rodrigo Janot, e questiona o artigo 29, caput, da Lei de Execução Penal (Lei 7.210/1984).

Segundo o dispositivo, o “trabalho do preso será remunerado, mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a 3/4 do salário mínimo. Para a PGR, o trecho viola os princípios constitucionais da isonomia e da dignidade da pessoa humana, além da garantia de ao menos um salário mínimo a todos os trabalhadores urbanos e rurais.

De acordo com Fux, no entanto, o trabalho do preso tem caráter educativo e produtivo. Ainda para ele, a reinserção no mercado de trabalho justifica o pagamento diminuto previsto na LEP.

“O trabalho do condenado constitui um dever, obrigatório na medida de suas aptidões e capacidades, e possui finalidades educativas e produtiva, em contraste com a liberdade para trabalhar e prover o seu sustento garantida aos que não cumprem pena prisional”, disse o ministro.

O voto também destaca que o cumprimento da pena privativa de liberdade gera restrições naturais ao exercício do trabalho. Isso, prossegue Fux, tende a “produzir correspondente depreciação” quanto ao valor pago pelo empregador pela mão-de-obra do preso.

“Considerando as peculiaridades da situação do preso, que constituem prováveis barreiras à sua inserção no mercado de trabalho, é razoável que o legislador reduza o valor mínimo de remuneração pela sua mão-de-obra com o intuito de promover as chances da sua contratação”, afirma.

“Por essas razões”, conclui o magistrado, “tem-se que a medida de fomento à contratação de mão-de-obra do sistema penitenciário, estimulando empregadores à escolha de detentos em detrimento de indivíduos não inseridos no sistema penitenciário, deixa incólume a dignidade humana do preso contratado, máxime quando o legislador obriga o poder público ao provimento das utilidades indispensáveis que o próprio salário se destinaria a cumprir”.

Ao abrir divergência, Fachin afirmou que a proteção constitucional dada ao salário mínimo tem por objetivo estabelecer uma retribuição mínima ao trabalho, piso que deve ser garantido a todos, sem distinção.

“O trabalho do preso, ainda que com caráter educativo e produtivo, é benefício, não pena. O trabalho do apenado visa precisamente a mitigar uma discriminação que lhe seria possível, em virtude do afastamento do convício social. Se sua liberdade pode ser restringida pela sentença, sua capacidade laboral, visando a sua integração social futura, não”, pontuou.

O ministro disse não ser possível alterar a obrigação do Estado com a garantia do emprego e com a proteção do trabalho, nem mesmo invocando para isso a ordem econômica da Constituição, sob pena de “decidir-se a causa com base em uma teoria econômica que a maior parte da sociedade não acolhe”.

“O preso tem direito à assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa, e, mais importante, ele paga o Estado para isso. Além disso, quanto à não aplicação da Consolidação das Leis do Trabalho à atividade desempenhada pela pessoa presa, trata-se de orientação interpretativa que subverte a primazia constitucional. Não é possível, porém, ler a Constituição Federal à luz da legislação. É a constituição a fonte de validade das demais normas do ordenamento”, conclui. As informações são da Revista Consultor Jurídico.

Conteúdo relacionado

Termos relacionados